Após aproximadamente 50 anos de domínio no Maranhão, a família Sarney vive uma crise sem precedentes no Estado. Pela primeira vez em toda a sua história, o clã tenta reverter um quadro político desfavorável, faltando cerca de um ano para as eleições estaduais. Com dificuldade de se renovar e atrair novos quadros, o grupo ainda não encontrou a receita para manter o controle do capital político que começou a construir ainda na década de 60.
Nos bastidores, até mesmo os aliados mais próximos da família Sarney admitem que o grupo está perdido no que se refere à montagem de uma estratégia que permita derrotar seu principal adversário, o presidente da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur), Flávio Dino. Pré-candidato ao governo do estado pelo PCdoB, Dino aparece em pesquisas internas com pelo menos 60% das intenções de voto.
Independentemente do resultado das eleições de 2014, os Sarney não têm um “herdeiro político” natural para manter a família no poder por muito tempo. Os próprios aliados admitem, em caráter reservado, que “o grupo envelheceu”.
Quadros importantes da família Sarney devem deixar a cena política a partir do ano que vem, seja pelo desgaste com a opinião pública local ou por conveniência pessoal. A própria Roseana Sarney (PMDB), ex-senadora e atual governadora do Maranhão, por exemplo, vive um dilema. Até agora, ela não decidiu se irá se dedicar a uma eventual candidatura ao Senado ou se vai encerrar a carreira política.
Cansada e com a saúde desgastada, Roseana vem reiterando a interlocutores que não gostaria de se submeter a mais uma eleição. Seu marido, Jorge Murad, conforme informações de pessoas próximas à família, também a pressiona a deixar os palanques em 2014.
A insistência para que ela se lance ao Senado parte basicamente de seu pai, o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP). Ele enxerga nessa possibilidade a única chance de uma sobrevida política, tanto para a filha quanto para o clã. Mesmo assim, uma sobrevida enfraquecida conforme os aliados. Roseana é tida como a última figura carismática capaz de manter a união do grupo no Maranhão. Os aliados acreditam que, em Brasília, na condição de senadora, ela não teria condições de manter a articulação política capaz de sanar os costumeiros choques de interesses internos de integrantes do clã no Estado.
A interlocutores, Roseana também tem dito que só deixaria de fato o cargo de governadora para se candidatar ao Senado se conseguisse articular a eleição indireta de Luís Fernando Silva (PMDB), secretário de infraestrutura do Estado, no início do ano que vem. Silva foi escolhido por Roseana como candidato do governo para enfrentar Dino na disputa ao governo do Estado em 2014. A manobra para uma eventual eleição indireta de Silva foi antecipada pelo iG , em setembro.
Herança
A avaliação que existe hoje na família Sarney é a de que outros possíveis herdeiros não têm cacife suficiente para conseguir manter o domínio da família no governo do Estado. O deputado federal Sarney Filho (PV-MA), Zequinha, se lançará ano que vem mais uma vez a uma cadeira na Câmara. E o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB-MA), tem dito que quer apenas concluir seu mandato como senador e encerrar a vida política.
Entre os aliados, Zequinha é visto como “eterno deputado federal” e, segundo interlocutores, lhe falta carisma e força política para encarar uma disputa para o governo do Estado, por exemplo. Sarney Filho nem tem apoio nem mesmo dos sarneístas em uma eventual disputa majoritária.
Lobão chegou a ser sondado como candidato ao governo para o ano que vem e sempre foi apontado como o nome mais forte do grupo para uma disputa contra Dino. Preterido por Luís Fernando Silva, Lobão ainda é apontado como um “plano B” do clã caso o secretário de Roseana não consiga decolar na disputa contra Dino no ano que vem.
Existem duas versões para a desistência de Lobão na disputa pelo governo do Maranhão em 2014. A primeira: o ministro de Minas e Energia abdicou de uma eventual candidatura por cansaço pessoal e para não criar uma crise interna no grupo. Outras fontes afirmam que a história é completamente diferente. Apoiado por José Sarney, o nome de Lobão teria sido vetado pelo marido de Roseana, Jorge Murad.
Nos bastidores, fala-se que, em um eventual mandato de Lobão ao governo maranhense, quem daria as cartas no Estado seria Edison Lobão Filho (PMDB-MA), hoje mantenedor da cadeira do pai no Senado.
Sem apoio de Roseana, Lobão também deve se eximir de trabalhar por Silva na disputa do ano que vem. Aliados da família, no entanto, dizem que Lobão ainda tem boas chances de ficar na corrida, caso Silva não consiga atingir pelo menos 20% das intenções de votos até março de 2014.
Independentemente de ser candidato ou não, Lobão quer encerrar a carreira política em 2018, quando termina seu último mandato como senador. Edinho Lobão, idem. O filho do ministro fala a interlocutores que deixa a cadeira do Senado caso o pai reassuma o cargo ou em 2018, ou caso o ministro de Minas e Energia não volte à Casa. Edinho Lobão diz que ganha mais trabalhando por suas empresas no Maranhão que disputando cargos eleitorais. “É cansativo. A minha família sofre muito com esse translado Brasília x São Luís. São quatro dias fora de casa semanalmente. É complicado”, admitiu Lobão Filho ao iG .
Outro quadro da família Sarney que poderia ser uma esperança de sobrevida do clã no Estado, Adriano Sarney, neto de Sarney, também custa a ser visto como herdeiro político forte e não tem a bênção da tia, Roseana. Adriano participará da primeira eleição em 2014, como candidato a deputado estadual. Mas nos bastidores, especula-se que ele deve seguir o mesmo destino de Zequinha Sarney.
Mudanças
Tanto aliados quanto adversários admitem que a eleição de Jackson Lago (PDT), em 2006, que teve seu mandato cassado três anos depois, foi o primeiro indício de uma mudança de mentalidade do eleitorado maranhense. Agora, líderes sarneístas e de outras correntes políticas locais afirmam que o Estado vive um sentimento inédito de mudança, que deve se refletir radicalmente nas urnas em 2014.
“A própria classe política, que sempre baixou a cabeça para o grupo, tal poder que eles têm, já começa a duvidar que esse poder vá continuar”, alfinetou José Reinaldo Tavares (PSB), ex-governador do Maranhão e ex-aliado dos Sarney. “Há um enfraquecimento do ponto de vista político também. Pela primeira vez, há o maior número de prefeitos eleitos pela oposição e alguns deputados ligados historicamente ao grupo Sarney iniciam um processo de desfiliação”, diz o líder da oposição na Assembleia Legislativa do Maranhão, Rubens Pereira Júnior (PCdoB).
Nas pesquisas internas, encomendadas pelos principais candidatos, o cenário aponta que Dino tem aproximadamente 60% das intenções de voto, contra 15% de Luís Fernando Silva. Nas pesquisas espontâneas (quando o eleitor não é estimulado a apontar nome de um candidato), Dino aparece com 40% das intenções de voto; Silva, não passa dos 5%.
Conforme políticos locais, esse sentimento de mudança tem sido corroborado por falhas graves na administração Roseana. Reeleita em 2010 com a promessa de fazer “o melhor governo da vida”, Roseana é cobrada por problemas crônicos no Estado, como a explosão da violência – principalmente na capital, São Luís -, deficiência na saúde, atrasos de obras e o não cumprimento de promessas de campanha.
Em comparação com 2012, por exemplo, o número de homicídios em São Luís cresceu 23% nos nove primeiros meses do ano conforme dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP-MA). Desses nove meses, oito foram marcados por recordes históricos mensais do número de assassinatos.
Algumas obras do governo do Estado arrastam-se por anos a fio, como uma avenida chamada Via Expressa, em São Luís, uma das principais promessas de campanha de Roseana. A avenida, cujo projeto é ter 9 km de extensão, começou a ser construída em abril de 2011 e deveria ter sido inaugurada em setembro do ano passado, em comemoração aos 400 anos da capital maranhense. Inicialmente prevista em R$ 109 milhões, a obra já teve suplementação orçamentária de R$ 7 milhões e prazo dilatado para o final de 2013. Dos R$ 116 milhões que serão gastos na obra, R$ 20 milhões foram alocados pelo Ministério do Turismo.
Máquina governamental
Mesmo em desvantagem nas pesquisas e tendo que defender um governo com tantos problemas, tanto sarneístas quanto oposicionistas reconhecem que, se a derrota nas urnas de fato ocorrer, não irá necessariamente significar uma derrota definitiva do clã Sarney.
A frase dita tanto por membros do governo, quanto pela oposição é que, desde quando Sarney assumiu Maranhão, nunca um candidato do governo perdeu um processo eleitoral. “Quem tem a máquina administrativa, sempre fez seu sucessor” é o mantra repetido nos corredores do Palácio dos Leões, sede do governo do Maranhão. “O grupo vê (as eleições de 2014) com um otimismo que me assusta. Eu vejo com moderação. Mas a história mostra que quem detém o poder, detém votos”, admite o líder do governo Roseana na Assembleia Legislativa, César Pires (DEM).
“O nosso medo para o ano que vem é quanto a possíveis abusos da máquina administrativa do Estado. Por isso que estamos vigilantes desde agora”, afirma Rubens Júnior. “Eu acho que esse discurso do fim do ciclo, o povo do Maranhão tem escutado já há muitos anos”, avalia o líder do PMDB na Assembleia Legislativa do Maranhão, deputado Roberto Costa. “O que o povo do Maranhão tem mostrado na hora da eleição é completamente diferente do que pensa a oposição. É dando o direito de nós continuarmos fazendo um governo pelo povo do Maranhão”, complementa Costa.
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