segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Sobre modelos de inserção pela via do consumo na estética do Shopping Center



É uma continuação do debate sobre a febre de Shopping Centers na cidade, analisada desta vez pela ótica do capitalismo:


Há uns cinco anos, São Luís possuía apenas um único grande shopping, construído sob o antigo lixão do Jaracati. Havia outro, bem menor, com jeitão mais de galeria do que de shopping e que reinou sozinho na capital por uns bons 20 anos.

Se a construção do segundo shopping só ocorreu mais de duas décadas depois do primeiro, a construção do terceiro, do quarto, do quinto e de um sexto shopping – que deverá funcionar na estrada que dá acesso ao Maiobão – tem ocorrido em espaços de tempo inferiores a dois anos.

Shopping Center funciona como uma espécie de atestado da existência de uma economia capitalista. Padronizado esteticamente, sendo igual em toda parte do mundo civilizado, o Shopping Center é visto como o exemplo maior de inserção social local, no mundo globalizado.

O problema é que, ao invés do que ocorreu em economias capitalistas do pós-guerra na Europa ou na América do Norte, o fortalecimento da economia capitalista nas chamadas periferias se deu apenas pela via econômica, não trazendo consigo os chamados marcos de desenvolvimento civilizatórios, especialmente de educação, segurança, saúde, acesso a bens culturais, etc.

Nas periferias, e aí se inclui o Brasil, a criação de uma política de distribuição de renda deu aos indivíduos um poder de consumo real e é inegável que a prosperidade econômica chegou aos lares em proporção considerável, mas é verdade também que, no caso do Brasil, a distribuição de renda não veio acompanhada do investimento na infraestrutura física e institucional do país.

O Brasil está cada vez mais sufocado pelo fracasso do sistema educacional, pela ausência absoluta de uma rede de saúde que atenda decentemente aos cidadãos, pela falência do sistema prisional e de segurança pública – num país que produz quase 60 mil homicídios por ano – e no colapso dos meios de transporte e de saneamento básico.

Nesse cenário o que se vê é um paradoxo. O cidadão comum tem condições materiais para frequentar o Shopping Center com sua família, mas está exposto a um ambiente externo marcado pela falência dos serviços mais básicos. Enquanto o Shopping Center é o paraíso artificial do consumo, capaz de criar a falsa sensação de bem estar, prosperidade e segurança, do lado de fora cresce a violência, o caos no trânsito e a presença dos indesejados, aqueles que, apesar do aumento na distribuição de renda, permanecem à margem, econômica e esteticamente impedidos de frequentar o Shopping Center.

É a esse modelo de inserção capitalista que São Luís está tardiamente aderindo. O aumento do número de Shopping Centers na cidade não é reflexo do desenvolvimento capitalista global, que trás consigo a melhoria geral na vida do indivíduo, ele é apenas o mascaramento do que há de pior no capitalismo: a ilusão de que apenas o consumo e a lei do mercado são suficientes para ordenar a sociedade.

Essa ilusão já trás mal estar nas cidades brasileiras que optam pela “estética do shopping center”. No Rio de Janeiro, um grupo de moradores de um morro próximo à Gávea foi impedido de entrar nas dependências do Shopping Leblon apenas porque sua aparência física destoava da aparência média de frequentadores do Shopping. Há três semanas, centenas de jovens da periferia de São Paulo marcaram um encontro pelas redes sociais para “ocupar” o estacionamento de um shopping na zona oeste da cidade. O movimento criou pânico nos frequentadores e lojistas, que decidiram fechar o shopping mais cedo, apesar dos jovens terem apenas feito uma espécie de flashmob para ouvir música.

Pânico semelhante ocorre nas imediações de dois Shopping Centers localizados nos bairros do Jaracati e Maranhão Novo, locais cercados por comunidades carentes, frequentemente acusadas de serem as responsáveis pelo aumento da violência nas redondezas.

É como se o pânico fosse uma espécie de clamor às autoridades para impedir a aproximação dos indesejados no único lugar que ainda oferece segurança nas cidades. É uma inversão absurda e hipócrita de prioridades, já que o que se espera de uma cidade é a garantia de segurança em todos os lugares e para todas as pessoas.

Essa anomia a mim parece o óbvio resultado da escolha que a cidade está fazendo por um projeto de inclusão social pela via exclusiva do consumo e não da cidadania.

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