terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Elite brasileira é uma grande classe C

Lendo este artigo eu lembrei quase que imediatamente das emergentes do Maranhão. Veja e tire suas conclusões.

POR PEDRO DINIZ


Há dois anos um financista francês e investidor de marcas de moda me falou sobre o tipo de produto que acreditava agradar as mulheres brasileiras: “qualquer coisa com uma logomarca bem nítida e que custe menos de R$ 1.500″. E completou: “Não publique isso usando meu nome, mas a elite brasileira é uma grande classe C.”

Na semana passada, marqueteiros de grifes de luxo procuraram institutos de pesquisa para traçar estratégias que desvinculem suas marcas da classe “menos abastada” que frequenta os “rolezinhos” –pessoas que, segundo o Data Popular, consomem cerca de R$ 129,2 bilhões por ano e adora polos Lacoste, tênis Mizuno e bonés John John.

Desde o boom das etiquetas estrangeiras no país, em 2010, pairam na cabeça dos investidores perguntas como “onde abrir a loja”? ou “quem vai consumir?”. Se antes havia um consenso a respeito da democratização do “novo luxo”, hoje, algumas grifes parecem querer fazer o caminho inverso.

A marca de cosméticos Clarins não entrou no Brasil, como anunciou seu CEO à Folha, em 2011, porque não encontrou “uma Champs-Élysées” por aqui. A Balenciaga também desistiu, sem explicar o motivo.

Cartier e Tommy Hilfiger saíram da rua Oscar Freire, que nunca foi luxuosa, para reposicionarem a estratégia de marketing.

Já o quarteto fantástico Prada, Chanel, Dior e Louis Vuitton só querem saber de shoppings –que oferecem facilidades para lojas estrangeiras iniciarem sua operação e, além de mais seguros que as ruas, até pouco tempo eram ambiente de gente “selecionada”.

Há uma equação esquizofrênica sobre o consumo que certas grifes esperam do Brasil. Parecem querer dos clientes a voracidade americana em adquirir bens de luxo, mas mantêm uma experiência de compra à francesa, com vendedores esnobes, muitos deles filhas de socialites, que esperam vender para magras (é conhecida a baixa oferta de tamanhos acima do G) e bem vestidos.

Tente entrar de chinelo e bermuda numa loja “de grife” e você saberá o que estou falando.

Bom exemplo de como essa ideia não funciona é a Diesel. A marca italiana fechou a operação no Brasil e voltou em 2012 para readequar seus negócios ao consumidor médio, que não pagava mais de R$ 1.000 num jeans nem se identificava com a imagem exclusivista vendida em suas campanhas.

Afinal, por que pagar milhares de reais se, em Miami, destino de compras do turista nacional, custa dezenas?

O mesmo investidor do início deste texto acredita que é necessário educar o brasileiro para o consumo de luxo. Não sabe, nem ele nem alguns entendidos desse mercado, que a cultura de moda nacional já se desenvolveu há tempos.

A influência do clima e da paisagem brasileira fez grifes como a carioca Farm –pense em toda a flora brasileira reunida numa estampa– e Le Lis Blanc, com seus tecidos leves e comprimentos curtos, preferidas entre os consumidores AAA.

Pesquisa da Rede LaClé, especializada em consumo de alto padrão, dá conta de que a Le Lis, por exemplo, é a marca mais lembrada pelas mulheres com renda acima de R$ 30 mil.

Numa estratégia acertada, a Adidas Originals, linha de luxo da grife esportiva alemã, juntou-se à Farm para lançar a primeira colaboração com uma marca brasileira. As roupas, estampadíssimas, são vendidas em todo o mundo.

A Prada entendeu o movimento. Em sua megaloja no shopping Cidade Jardim, em São Paulo, chovem itens “em conta” e araras cheias dos prints floridos da sua última coleção.

Há também a nova “double bag”, que serve como duas em uma.

Até a Chanel, numa manobra irônica de Karl Lagerfeld, causou tumulto na última semana de Alta Costura, em Paris, ao misturar pochete e tênis na passarela. O look esportivo enchia as lojas das periferias nas grandes capitais nos anos 1990.

A questão de classe no consumo de moda, aos poucos, deixa de ter importância e, quem não entender o recado sairá do país queimado.

PEDRO DINIZ é jornalista de moda

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