Revista Época
Investigação apura o destino de R$ 50 milhões repassados por mineradora canadense a uma cooperativa de Imperatriz (MA) pela exploração de Serra Pelada.
A dona de casa Antônia Alves de Oliveira, de 58 anos, leva uma vida tranquila em Imperatriz, a segunda maior cidade do Maranhão – e, no mapa político do Brasil, capitania de Edison Lobão, do PMDB, ministro de Minas e Energia. Antônia gasta os dias cuidando do pequeno jardim de sua casa, no modesto bairro Parque Alvorada. Interrompeu os afazeres domésticos para receber ÉPOCA na tarde da última segunda-feira, sob um úmido calor de 33 graus. Não havia ar-condicionado. Ela ofereceu água gelada, servida em copos de alumínio. Contou a história de sua família. É uma história que, como muitas outras em Imperatriz, se confunde com a aventura do garimpo de Serra Pelada, no sul do Pará. Na década de 1980, ele chegou a ser o maior do mundo. Imperatriz fica relativamente perto de Serra Pelada, e a oportunidade de fazer dinheiro levou muitos pais de família ao sul do Pará. Além do ex-marido de Antônia, seus três irmãos foram garimpeiros. Um deles, Davi Alves Silva, aliado de Lobão no PFL, antigo partido do ministro, se elegeu deputado estadual, deputado federal e prefeito de Imperatriz, quando Lobão era governador do Maranhão, em 1990. Davi foi assassinado em 1992, ano em que o governo federal resolveu pôr fim ao garimpo em Serra Pelada – ao menos com as mãos, não era mais possível achar ouro. A partir dali, apenas com alta tecnologia. “Serra Pelada deu muita chateação, mas ainda tem muito ouro lá”, diz Antônia. Se, para a maioria dos garimpeiros, o ouro acabou, para alguns poucos, como Antônia, o ouro continua brotando da terra, como que por milagre.
A dona de casa Antônia Alves de Oliveira, de 58 anos, leva uma vida tranquila em Imperatriz, a segunda maior cidade do Maranhão – e, no mapa político do Brasil, capitania de Edison Lobão, do PMDB, ministro de Minas e Energia. Antônia gasta os dias cuidando do pequeno jardim de sua casa, no modesto bairro Parque Alvorada. Interrompeu os afazeres domésticos para receber ÉPOCA na tarde da última segunda-feira, sob um úmido calor de 33 graus. Não havia ar-condicionado. Ela ofereceu água gelada, servida em copos de alumínio. Contou a história de sua família. É uma história que, como muitas outras em Imperatriz, se confunde com a aventura do garimpo de Serra Pelada, no sul do Pará. Na década de 1980, ele chegou a ser o maior do mundo. Imperatriz fica relativamente perto de Serra Pelada, e a oportunidade de fazer dinheiro levou muitos pais de família ao sul do Pará. Além do ex-marido de Antônia, seus três irmãos foram garimpeiros. Um deles, Davi Alves Silva, aliado de Lobão no PFL, antigo partido do ministro, se elegeu deputado estadual, deputado federal e prefeito de Imperatriz, quando Lobão era governador do Maranhão, em 1990. Davi foi assassinado em 1992, ano em que o governo federal resolveu pôr fim ao garimpo em Serra Pelada – ao menos com as mãos, não era mais possível achar ouro. A partir dali, apenas com alta tecnologia. “Serra Pelada deu muita chateação, mas ainda tem muito ouro lá”, diz Antônia. Se, para a maioria dos garimpeiros, o ouro acabou, para alguns poucos, como Antônia, o ouro continua brotando da terra, como que por milagre.
Foi por influência dele que, em 2007, o governo convenceu a Vale a abdicar do tesouro ainda existente em Serra Pelada. Estima-se que o ouro remanescente valha, por baixo, R$ 3 bilhões. Por apenas US$ 59 milhões, a Vale aceitou transmitir a uma cooperativa de antigos garimpeiros os direitos de exploração mecanizada da área. Antônia e outros garimpeiros tomaram o controle da cooperativa. Com o aval do Ministério de Minas e Energia, já ocupado pelo PMDB, tornaram-se sócios da empresa de mineração canadense Colossus. Em 2010, com Lobão no ministério, a Colossus aumentou sua participação no consórcio com os garimpeiros de 51% para 75%. O que rendeu aos garimpeiros – especialmente a partir 2010, ano em que Lobão venceu mais uma eleição ao Senado – a quantia de R$ 50 milhões, segundo a própria Colossus.
De acordo com o Ministério Público, a dona de casa Antônia recebeu dos canadenses, em sua conta pessoal no Banco do Brasil, R$ 19,2 milhões, entre janeiro de 2010 e março de 2011. Um rastreamento do Conselho de Controle das Atividades Financeiras, o Coaf, que investiga casos de lavagem de dinheiro, revelou que 65% desse total foi sacado na boca do caixa. Alguns dos saques foram superiores a R$ 100 mil. Antônia era tesoureira da cooperativa. Como o dinheiro foi sacado, os investigadores não conseguiram descobrir os beneficiários finais da fortuna. O que Antônia fez com tantos milhões? Claramente, o dinheiro não foi investido em seu jardim, embora ela tenha também uma casinha na Vila Lobão, bairro batizado em homenagem ao padroeiro. “Não ficava nada comigo. Podem abrir minhas contas no banco. Se entrasse o dinheiro às 11 horas, às 17 horas não tinha mais nada. Tinha uma lista de pagamentos para fazer”, afirma Antônia. Ela não conta para quem passava o dinheiro. No máximo, diz que fazia “pagamento de despesas administrativas” da cooperativa.
Antônia é amiga do garimpeiro Gesse Simão de Melo, o entusiasmado senhor que aparece no palanque da foto acima, junto a Lobão. Gesse era presidente da cooperativa, quando Antônia era tesoureira. Para chegar ao comando da cooperativa, os dois receberam a ajuda do radialista Antônio Carvalho Duarte, ex-assessor de Lobão no Senado Federal. Hoje Antônio comanda outra associação de garimpeiros. Foi Gesse quem assinou parte dos contratos com a Colossus. Segundo o Coaf, ele recebeu R$ 344 mil dos canadenses, após o dinheiro passear pela conta de quem ele diz ser seu assessor – um sujeito que ganhou R$ 890 mil da Colossus. Essas operações foram rastreadas entre março e junho de 2010. No dia 4 de maio daquele ano, sob a supervisão do Ministério de Minas e Energia, a cooperativa, representada por Gesse, fechara com a Colossus o acordo que aumentava para 75% a participação dos canadenses no negócio. O acordo já estava encaminhado dentro do ministério, àquela altura representado pelo ministro interino, Márcio Zimmermann. Lobão deixara o ministério havia pouco para se dedicar à campanha eleitoral – Gesse foi cabo eleitoral de Lobão. O documento de 4 de maio é o que respalda até hoje a parceria entre a Colossus e os garimpeiros. Depois dessa data, a Colossus ampliou as milionárias transferências para as contas dos garimpeiros ligados a Lobão.
Assim como Antônia, Gesse mora em Imperatriz. Recebeu ÉPOCA em sua casa e negou que tenha se apropriado do dinheiro dos garimpeiros, ou que tenha repassado esse dinheiro a terceiros. Disse que os recursos foram usados para despesas com a realização de assembleias gerais convocadas pela cooperativa. “Era gente de todo lugar que tinha de trazer para Curionópolis (em Serra Pelada)”, afirmou. “É um povo sem recurso. E que não podia ficar de fora dessas assembleias, eram decisões importantes para o futuro do garimpo.” A conta bancária da cooperativa, segundo Gesse, estava bloqueada por causa de dívidas questionadas na Justiça. “Ou você recebia desse jeito ou parava a cooperativa.” Outros dois garimpeiros que receberam dinheiro da Colossus, ambos funcionários públicos do Estado do Maranhão, disseram que repassaram parte do dinheiro, em espécie, ao advogado Jairo Leite, ex-funcionário do Senado ligado a Lobão.
Tanto para o Ministério Público do Pará quanto para o Ministério Público Federal, é ilegal a operação que permitiu aos canadenses tomar conta de Serra Pelada. O promotor Hélio Rubens apresentou denúncia na Justiça contra Gesse, Antônia e outros três garimpeiros ligados a Lobão. Acusa-os de apropriação indébita de dinheiro, ocultação de valores desviados e formação de quadrilha. O Ministério Público Federal tenta cancelar o contrato com os canadenses. Segundo os procuradores, o contrato foi feito sob medida para a Colossus, e o aumento da participação dos canadenses no consórcio foi fechado sem o aval da maioria dos garimpeiros. Essa ação também tramita na Justiça. Em 2012, diante dos fatos, a Justiça determinou o afastamento da turma do comando da cooperativa. Os investigadores ainda tentam descobrir quem recebeu o restante dos R$ 50 milhões. Procurado por ÉPOCA, o ministro Lobão afirmou que conheceu Gesse como militante político em Imperatriz nos anos 1980. Disse que conheceu Antônio Duarte na mesma época e confirmou que ele trabalhou duas vezes em seu gabinete de senador, como assessor de imprensa. Lobão afirma desconhecer o relatório do Coaf que apontou as movimentações atípicas de Gesse e Antônia. Ele informou ainda que não recebeu qualquer ajuda financeira da Colossus durante as eleições de 2010.
Cláudio Mancuso, CEO da Colossus, disse a ÉPOCA que os valores transferidos à cooperativa estavam previstos no contrato firmado com os garimpeiros para retomar a exploração mineral em Serra Pelada. Segundo ele, cerca de R$ 50 milhões foram repassados à cooperativa desde o início da parceria, incluindo a “compra de direitos minerários”, antes pertencentes à cooperativa. “Fizemos as transferências para contas indicadas pela cooperativa”, disse ele.
Quem recebeu os R$ 50 milhões? Certamente os beneficiários não estão na sede da cooperativa em Imperatriz, conhecida como “casa do garimpeiro”. No escritório, há até máquina de escrever. Na manhã de terça da semana passada, havia cerca de 20 garimpeiros na casa, todos senhores, jogando dominó e batendo papo sob a sombra das árvores. Todos reclamavam da vida que tiveram no garimpo. Nenhum deles confirmou ter recebido dinheiro dos canadenses nem de nenhum santo padroeiro.
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