terça-feira, 12 de novembro de 2013

Sarney, João Alberto e Cafeteira recebem remunerações que ultrapassam R$ 60 mil

Grupo de 30 políticos recebe acima do teto do funcionalismo, sob vista grossa dos presidentes da Câmara e do Senado.

Jornal o Globo


PARCEIROS ACIMA DA LEI Os senadores pelo Amapá e
pelo Maranhão, José Sarney e João Alberto.
Foto: Reprodução
Apesar da determinação do Tribunal de Contas da União (TCU) de cortar os super salários dos servidores da Câmara e do Senado que ganham acima do teto constitucional (R$ 28.059,29), os presidentes das duas Casas, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e Renan Calheiros (PMDB-AL), fazem vista grossa a seus companheiros e ex-companheiros de plenário. Ao acumularem gordas aposentadorias nos estados, os parlamentares chegam a receber remunerações individuais que ultrapassam R$ 60 mil brutos, mais do que o dobro do teto.

Até hoje, Câmara e Senado não fizeram o trivial, em razão da pressão e do corporativismo inerentes ao Legislativo: o envio de um ofício a cada um dos parlamentares — na ativa e aposentados — com a cobrança de informações sobre outros salários para evitar os pagamentos acima do teto. Iniciativas nesse sentido chegaram a ser cogitadas, mas foram abortadas pelas diretorias gerais das Casas.

Hoje, a ausência de um cruzamento de dados é a desculpa oficial para não haver o corte dos super salários. Um levantamento do Globo revela que pelo menos quatro deputados, oito deputados aposentados, 11 senadores e sete senadores aposentados acumulam o subsídio de parlamentar, de R$ 26,7 mil, com aposentadorias nos estados, cujos valores variam entre R$ 6 mil e R$ 35 mil.

TEM A VIDA DE UM LUTADOR? Como José Sarney 
e João Alberto, Cafeteira também é beneficiado
 com a aposentadoria de ex-governador do Maranhão. 
Foto: Agência Senado
O pagamento do que excede ao teto no caso do seleto grupo de 30 parlamentares custa anualmente R$ 5,5 milhões aos cofres públicos, num cálculo aproximado. Reservadamente, gestores das duas Casas reconhecem a ilegalidade dos pagamentos e o desrespeito ao teto constitucional.

Em 2009, parlamentares fizeram uma consulta ao TCU para saber se poderiam acumular o subsídio de deputado com a aposentadoria de juiz estadual aposentado. O tribunal respondeu que o acúmulo poderia ocorrer, desde que respeitado o teto constitucional. Não é o que ocorre na Câmara e no Senado.

Na resposta, o TCU cita a necessidade de cumprimento do artigo 37, inciso XI, da Constituição, que deixa claro não ser permitido a nenhum funcionário ou detentor de cargo público receber acima dos rendimentos de um ministro do STF, mesmo que de forma cumulativa com outros benefícios. Foi este o argumento utilizado nos acórdãos do TCU para determinar os cortes dos super salários dos servidores.



A premissa, no entanto, não valeu para deputados e senadores, conforme justificativa expressa no mesmo acórdão: a aplicação do teto no caso de acumulação de cargos depende da ‘implementação do sistema integrado de dados’ e de ‘normatização infraconstitucional’ sobre qual teto deve ser considerado.

A maioria dos deputados e senadores com ganhos superiores a R$ 28 mil soma os subsídios de parlamentares com aposentadorias vitalícias pagas pelo fato de terem sido governadores. Mesmo com a polêmica deflagrada em 2011 em razão da revelação dos pagamentos de super pensões e com 12 ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) em curso no STF para derrubar o benefício, os pagamentos continuam sendo feitos e se somam aos salários do Legislativo.

Os senadores Casildo Maldaner (PMDB/SC) e Luiz Henrique (PMDB/SC), que governaram Santa Catarina, chegam a acumular três pagamentos: o salário de senador, de R$ 26,7 mil; a aposentadoria de ex-governador, de R$ 23,8 mil; e um ‘subsídio de ex-parlamentar’ pago pelo estado, entre R$ 7,5 mil e R$ 8,5 mil. Eles recebem ao todo R$ 59 mil e R$ 58 mil brutos, respectivamente. O Globo não conseguiu contato com Maldaner. A assessoria de imprensa de Luiz Henrique informou que ele abriu mão de sua parte como deputado e que deposita judicialmente o dinheiro pago pelo governo de Santa Catarina por não concordar com a lei que o permitiu.

O ex-presidente do Senado, José Sarney (PMDB/AP), também é beneficiado por aposentadorias de R$ 35 mil, a maior delas por ter sido governador do Maranhão. Outros ex-governadores do estado, os senadores João Alberto (PMDB) e Epitácio Cafeteira (PTB), recebem a mesma aposentadoria. Em Rondônia, Ivo Cassol (PP) e Valdir Raupp (PMDB) somam ao salário de R$ 26,7 mil pelo menos outros R$ 20 mil. As assessorias deles não retornaram as ligações.

Contra interpretação do TCU

O líder do DEM no Senado, José Agripino (RN), também tem uma aposentadoria. A assessoria informou que ele a recebe porque estava prevista na Constituição do Estado anterior à de 1988. Outros senadores com ganhos superiores ao teto são os ex-governadores Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), Roberto Requião (PMDB-PR) — cujo benefício foi mantido depois de muita briga na Justiça — e Jorge Viana (PT-AC). Entre os senadores aposentados que acumulam rendimentos, estão o ex-vice-presidente da República Marco Maciel, que governou Pernambuco, e o ex-governador de Santa Catarina Jorge Bornhausen.

Na Câmara, pelo menos quatro deputados acumulam ganhos de ex-governadores: Esperidião Amin (PP/SC), Eduardo Azeredo (PSDB/MG), Júlio Campos (DEM/MT) e Flaviano Melo (PMDB/AC). Eles passam ilesos a cortes de salário. O deputado Carlos Bezerra (PMDB/MT) não teve a mesma sorte: trata-se do único caso de parlamentar que teve abate-teto aplicado em razão de uma decisão da Justiça Federal em Mato Grosso. Desde 2009, Bezerra recebe o teto, o que praticamente significa perder a aposentadoria de R$ 11,6 mil por ter sido governador do estado. O mesmo não ocorre, por exemplo, com seu conterrâneo Júlio Campos.

O diretor-geral da Câmara, Sérgio Sampaio, já chegou a recorrer contra a interpretação do TCU de que a acumulação dos cargos deve respeitar o teto salarial.

— Nós não temos um levantamento dos casos de acúmulo de remunerações. Não temos uma fonte onde consultar — disse Sampaio.

Moreira Franco soma aposentadoria

A decisão do TCU de cortar os super salários dos servidores da Câmara atingiu o contracheque de uma única deputada, Nice Lobão (PSD-MA), não pelo fato de ela ser parlamentar, mas por ter ocupado um cargo comissionado na Câmara a partir de 1980. A mulher do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, acumulava até setembro o salário de deputada e a aposentadoria de servidora. Diante da impossibilidade legal, o corte chegou a R$ 17 mil.
R$ 17 MIL A MENOS Esposa de Lobão foi a única do Clã Sarney
que teve seu salário cortado pela decisão do TCU.
Foto: Agência Câmara Notícias
Nice Lobão exerceu o cargo de ‘assistente legislativo classe A’ antes de ser eleita pela primeira vez em 1999, ano em que se licenciou para exercer o mandato. Ao fazer 70 anos, em 2006, aposentou-se do cargo de servidora e passou a acumular a aposentadoria. Os ganhos indevidos desde então, até ser atingida pela decisão do TCU, somam quase R$ 1,5 milhão — ou R$ 1 milhão, se for levado em conta o prazo de cinco anos para uma eventual devolução do dinheiro, como decidiu o TCU para os servidores do Senado.

Entre os deputados aposentados com remuneração acima de R$ 28 mil está o ex-governador do Estado do Rio Celso Peçanha. São R$ 17,5 mil como ex-deputado e R$ 20,6 mil como ex-governador. Este é o valor pago ao ministro da Secretaria de Aviação Civil, Moreira Franco, que governou o Rio.

No caso do ministro, o Executivo aplica um abate-teto de R$ 15,8 mil. Mesmo assim, somadas as remunerações brutas, o salário final é de R$ 31,5 mil. A assessoria do ministro informou que ele já havia comunicado ao governo do aumento do valor da pensão de ex-governador e que, portanto, o corte será maior, ficando dentro do limite do teto. Ainda de acordo com a assessoria, esta elevação foi comunicada ao Conselho de Ética e o ministro teria recebido um elogio por isso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário