terça-feira, 4 de março de 2014

Ministério Público Federal investiga gasto público com carnaval

de O Imparcial


Vitrine para quem disputará as eleições, o carnaval traz todos os anos um desfile de irregularidades. Tem o bloco das licitações fraudulentas na contratação de shows, o do desvio de verba pública para promoção de festas e até o da campanha antecipada de potenciais candidatos. Nos últimos cinco anos, a folia com o dinheiro do contribuinte motivou o Ministério Público Federal a abrir pelo menos 198 investigações contra prefeituras, governos estaduais e/ou agentes políticos, de acordo com levantamento. No ano passado, 12 procedimentos investigatórios foram instaurados.

Em meio ao carnaval de 2014, a folia das últimas eleições, em 2012, ainda rende investigações, denúncias criminais e condenações. No mês passado, o Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais confirmou sentença contra o ex-prefeito de Itaúna (MG) Eugênio Pinto e sua então mulher, Iris Leila Rodrigues — à época chefe de gabinete da prefeitura. De acordo com o Ministério Público Eleitoral do estado, ela era candidata a vereadora no município e os dois, condenados por abuso de poder político e econômico, usaram dinheiro público para promovê-la em festas da cidade, inclusive no carnaval de 2012.

“Esses eventos tinham forte apelo feminino e nítido caráter eleitoreiro, especialmente pelas cores e pelos dizeres utilizados, os quais, inclusive, coincidiam com aqueles utilizados pela candidata em sua campanha, sinalizando evidente uso da máquina eleitoral. Até os convites para os eventos eram feitos em nome da chefe de gabinete”, explica o promotor de Justiça de Itaúna Fábio Galindo Silvestre. Os dois também respondem na Justiça comum pelas acusações. A defesa não foi encontrada pela reportagem.

Em São Mateus do Maranhão (MA), o MPF apura a consistência de denúncias de vereadores contra o prefeito Hamilton Nogueira Aragão, conhecido como Miltinho Aragão (PSB), para decidir se abre inquérito. Segundo adversários, ele contratou empresas para o carnaval de 2013 com preços superfaturados. No início da tarde da última sexta-feira (28), a atendente da prefeitura informou que o expediente dos funcionários havia acabado.

Outros casos comuns na folia irregular são os de repasses de verbas públicas para entidades privadas produzirem bailes de carnaval, sem que a contratada comprove ter estrutura para promover o evento. No início da semana, o Ministério Público de Rondônia emitiu recomendação para que o governo estadual suspendesse os repasses no valor de R$ 2,5 milhões para a Sociedade Cultural Carnavalesca e Esportiva Arco-Íris. Oficialmente, a verba seria aplicada para promoção de festas em Porto Velho e Nova Mamoré, duas cidades que estão em situação de emergência devido à enchente provocada pelo Rio Madeira.

O Ministério Público identificou diversas irregularidades, entre elas comprovação ou especificação das atividades a serem realizadas nas localidades contempladas pelo projeto, a exemplo dos artistas e das bandas que se apresentarão. O que alertou os promotores foi o fato de Nova Mamoré estar completamente ilhada em razão das fortes chuvas. A Sociedade Arco-Íris tem apenas quatro associados e a sede fica na casa do tesoureiro do grupo. O MP sugeriu que os recursos sejam destinados à promoção de ações sociais e atividades restauradoras, já que parte da cidade ficou destruída após a cheia. A Secretaria de Cultura, responsável pelo repasse dos recursos, afirmou que cumpriria a orientação do Ministério Público.

Emendas parlamentares

A folia de 2014 também começa com suspeitas. Em Pernambuco, por exemplo, deputados estaduais candidatos à reeleição utilizam emendas parlamentares para contratar grupos musicais e se promoverem nas bases eleitorais. Este ano, os deputados estaduais Gustavo Negromonte (PMDB) e Antônio Moraes (PSDB) conseguiram recursos por meio das emendas para contratar dois shows da banda de pagode Karametade. As emendas, alvos recorrentes de reclamação dos deputados por considerarem que o valor repassado é muito baixo, são cotas recebidas por cada parlamentar para serem destinadas a áreas consideradas prioritárias. No mês passado, o mesmo grupo se apresentou no município de Iati (PE), também por meio de emenda do deputado Sílvio Costa Filho (PTB-PE).

O que chama a atenção é a quantidade de apresentações da mesma banda em apenas quatro dias de carnaval. Serão nove shows. Pela grade oficial, os músicos se apresentam no mesmo dia e horário em duas cidades diferentes, Arcoverde e Paudalho, que ficam distantes 300 quilômetros uma da outra. A farra da banda Karametade custará R$ 675 mil aos contribuintes pernambucanos. Parte dos recursos utilizados para pagar o cachê são do governo de Pernambuco. Cada apresentação sai por R$ 75 mil, valor acima do preço praticado pela banda em outros estados do Brasil.

A Secretaria de Turismo de Pernambuco comunica que a divulgação de dois shows no mesmo dia e horário, em cidades diferentes, ocorreu por erro de digitação. Sobre o cachê, a secretaria afirmou que “na convocatória do carnaval, todos os artistas interessados em participar da programação apresentaram referências de cachê atualizadas com apresentação de notas fiscais. No caso específico do Karametade, a produção da banda apresentou a comprovação dos cachês”.
Colaborou Carol Santos 

Três perguntas para Kelston Lages, Procurador regional eleitoral no Piauí

O MPF no Piauí lançou, por meio de campanha no rádio, alerta aos políticos sobre a proibição de propaganda extemporânea no carnaval. É um período que preocupa o MPF?

A campanha tem caráter preventivo. Tradicionalmente, há pré-candidatos que se aproveitam do período carnavalesco para fazer propaganda antecipada. A nossa ideia é alertar sobre as possíveis infrações que isso pode acarretar. Os casos mais comuns são usar referências diretas ou alusões dissimuladas às eleições de 2014 em abadás, camisetas, blocos e etc. Isso pode comprometer o equilíbrio das eleições.

Prefeitos que não são candidatos também estão na mira do MPF?

Sim. Embora não haja eleições municipais este ano, há prefeitos que têm vinculação a algum candidato do pleito majoritário, seja ao Senado, a governos estaduais, seja à Câmara dos Deputados. A orientação que demos aos promotores eleitorais é exatamente ficar atento a essas situações, porque prefeitos podem acabar custeando irregularidades com recursos do poder público, desvirtuando a imagem da própria instituição.

Esse é o trabalho preventivo. Após o carnaval, qual é o caminho para o MPF? 

A gente orienta o promotor a instruir com base em elementos como imagens flagradas durante a folia. Hoje, todo mundo tem câmera nos aparelhos celulares, que também filmam, inclusive. No caso de irregularidades com a participação de prefeitos, pode ficar caracterizado crimes mais graves, como improbidade administrativa e outros. Carnaval é uma grande chance para os políticos por causa da aglomeração de pessoas. Eles aproveitam para se promoverem.

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